Manu, na sexta-feira após o expediente sentou-se na mesa de um badalado bar de sua cidade de origem.
Logo de cara pediu uma dose dupla de Martini.
- O momento exige, disse ao garçom que lhe atendeu.
Nesse dia optou pela sua própria companhia. Não que a companhia de seus amigos não lhe serviria. Entretanto, ela necessitava de um tempo consigo mesma. Ainda que ironicamente seu recolhimento tenha sido em um bar e acompanhada de Martini. É, em Manu ainda lhe restava algumas ações movidas pela imprevisibilidade.
Ela era uma jovem de 20 e poucos anos. Beleza comum para os padrões da mídia. No entanto, alguns anos atrás para esse mesmo padrão da mídia ela continuava sendo uma beleza comum, porém para quem a conhecia ela era dotada de uma beleza extraordinária, pois Manu era autêntica, sonhadora. Atualmente recém saída de um término de namoro e também havia alcançado ascensão profissional não tinha dois anos completos. Acontece que, entre o término do namoro e a ascensão profissional havia uma lacuna.
Não que o término não lhe afetasse. Sim, ela realmente sentia aquele término. Nem o término serviu de inspiração para voltar a escrever (pensou ela). Mas o que a deixava incompleta era o fato de ter alcançado ascensão profissional em uma área que ela optou por conveniência.
Sim, muitas vezes escolhemos por conveniência.
Justamente o que lhe incomodava era o fato de ter optado por algo que não combinava com seu perfil e ela não entendia o por que da escolha. Justamente ela que se considerava tão dona de si, não entendia o motivo de ter abandonado o seu sonho de escrever para cursar administração (que me desculpe os administradores, mas há quem afirme que esse curso é dos indecisos). E sim, Manu por algum motivo optou aos 18 anos pela administração e não pela escrita.
Hoje, com apenas 20 e poucos anos experimenta o sucesso profissional mas acompanhado da frustração pessoal.
Ainda por cima, pra completar Manu não consegue escrever mais (nem a bebida, nem o término da namoro, nem a frustração lhe servem de inspiração). A escrita que antes era canal de libertação tornara-se pesada e inexpressível. Contraditório, pois justamente a escrita que ela sempre usava para se expressar, tornou-se linguagem sem expressão. Linguagem não verbalizada.
Manu, pediu ainda mais algumas doses e continuou refletindo por longa data sobre as escolhas feitas.
Precisava tomar uma decisão pois não estava feliz. Entretanto, embora jovem, o estresse da profissão, da correria, da vida e principalmente das escolhas mal feitas lhe havia enrijecido a sensibilidade e isso estava lhe apressando a sua morte.
Já avançava a hora quando ela resolveu ir pra casa. Não havia chegado a uma conclusão sobre seu dilema.
Antes porém de sair pediu mais uma dose e um último pensamento lhe veio à mente. Um último fantasma lhe penetrou a razão.
Pensou justamente que a hora já estava avançada e amanhã (justamente no sábado) teria uma reunião importante que não poderia faltar. Que tudo aquilo se tratava da vida real e não ilusões juvenis.
Assim como muita gente, Manu deixou de sonhar e lutar pelo que deseja. Sonhos viraram clichês infantis. Infelizmente, cresceu e acha que para seus anseios não há mais espaço. Aos poucos também vai deixando de sonhar. Aos poucos também passa a acreditar na maior das inverdades que se materializa como verdade absoluta. A saber: a partir de uma escolha feita torna-se obrigatório seguir adiante com essa escolha, ainda que ela não seja a melhor das opções. Seguir sempre adiante pois a vida também segue seu curso. Poucos contrariam o sistema e recomeçam quantas vezes forem necessárias para alcançarem sua plenitude.
A.K.